
Neste artigo trago um pequeno guia para ensinar as empresas a lidar com a garantia da alienação fiduciária.
Só quem já passou por isso sabe o quanto é desesperador receber uma notificação do banco avisando que vão tomar seu imóvel.
E asseguro que na maioria dos casos não se trata de dinheiro, mas do valor simbólico que um imóvel possui para qualquer pessoa.
Seja uma casa, uma chácara ou a sede da empresa, no geral há muito suor e dedicação investidos.
E para quem deu o imóvel em garantia num contrato de alienação fiduciária, perder um imóvel é algo que pode simplesmente acontecer a qualquer momento.
Por este motivo, a alienação fiduciária é considerada o terror das garantias de dívidas bancárias.
Nesta publicação, quero compartilhar com você a experiência de lidar com esses dramas pessoais no meu dia-a-dia.
E também trazer um pequeno guia de como lidar com essa situação, para evitar maiores perdas e possivelmente salvar seu imóvel.
Afinal, como lidar com a alienação fiduciária, o terror das garantias?
O que é alienação fiduciária?
As operações de crédito bancário (empréstimos e financiamentos) podem ocorrer com ou sem garantia.
Dentre as garantias, uma bastante comum é a alienação fiduciária, que pode ser feita tanto com bens móveis (veículos, por exemplo) quanto imóveis.
É comum ouvir-se falar que determinado bem está “alienado”.
A alienação fiduciária é uma modalidade de garantia por meio da qual o devedor dá um bem móvel ou imóvel para garantir o pagamento de uma dívida.
O devedor fica com a posse direta, ou seja, fica com a detenção física do bem dado em garantia.
E o credor fica com a posse indireta.
Caso o devedor não pague, o credor passa a ter a posse direta do bem.
Alienação fiduciária pode envolver a perda de um bem

A alienação fiduciária de bem imóvel envolve um procedimento de tomada do bem tão agressivo que nem precisa de processo judicial.
Por lei, basta o banco mandar uma carta para o devedor, avisando que ele precisa pagar o que está devendo até uma determinada data, caso contrário perderá a propriedade do bem.
Na verdade, em termos um pouco mais técnicos, a propriedade do bem vai se consolidar na titularidade do banco.
Se o devedor tem consciência de que não vai conseguir pagar a dívida na data notificada, já bate o desespero de perder o bem conquistado a duras penas, muitas vezes com o trabalho de toda uma vida.
Quem é o verdadeiro proprietário do bem?
Com o bem alienado, é como se tanto o banco quanto o devedor fossem um pouco proprietários.
Quando o devedor paga todo o valor da dívida, a propriedade do bem passa a ser plena.
Quando o devedor não consegue pagar a dívida, a propriedade plena fica com o credor, que é o banco.
Perceba que a alienação fiduciária é uma forma de garantia muito forte, extremamente agressiva e bastante prejudicial ao devedor.
É um tipo de garantia que pode ser executada de forma rápida, sem a necessidade de uma ação judicial .
Os bancos têm esse direito?

Sim, eles têm o direito.
A alienação fiduciária é prevista em Lei e o banco tem todo o direito de contratar com os seus clientes por meio dessa modalidade de garantia.
Antes da alienação fiduciária, a forma mais comum de garantia de empréstimos bancários era a hipoteca.
A execução da hipoteca só pode ser feita por ação judicial e é muito comum que o processo demore por anos.
Temos casos no escritório com mais de 10 anos de trâmite processual.
Para o devedor, levar 10 anos para ser executado pelo banco pode ser bastante vantajoso, mas para o banco é um prejuízo enorme.
Por isso, com o surgimento da Lei 9.514, de 1997, que instituiu a alienação fiduciária de bens imóveis no direito brasileiro, os bancos tiveram uma grande vitória.
Contando o tempo para a notificação do devedor, hoje o banco pode tomar seu imóvel em pouco mais de um mês.
A lei é extremamente rigorosa
A Lei que instituiu a alienação fiduciária é extremamente rigorosa.
E é por esta razão que os bancos preferem tanto esta modalidade de garantia.
E sob a aparência de um ótimo negócio, você pode estar assinando a sua própria sentença de morte.
Ou para ser um pouco menos dramático, pode estar entregando de bandeja para o banco o imóvel que você suou tanto para conquistar.
Já acompanhei a situação de empresários que tomaram empréstimo com o banco e deram em garantia a própria sede da empresa.
Pouco tempo depois, sem capacidade de pagamento das parcelas, perdiam o imóvel e fechavam as portas, simplesmente porque não havia condições de tocar o negócio sem uma sede.
Alienação fiduciária só vale para os financiamentos de bens imóveis?

Além deste uso como garantia de financiamentos relativos ao próprio bem, os bancos também usam esse tipo de garantia para financiamentos de veículos e mesmo empréstimos em geral.
Por exemplo, empresas em dificuldades com o caixa conseguem viabilizar operações de crédito para capital de giro tendo como garantia a alienação fiduciária de bens imóveis.
Não é o que recomendamos, claro, mas é muito comum que, no desespero, o empresário ofereça sua própria casa em garantia de um empréstimo dessa natureza.
Antes da alienação fiduciária, os bancos se utilizavam da hipoteca
Como eu disse, a garantia mais comum envolvendo bens imóveis até o surgimento da alienação fiduciária era a hipoteca.
Era muito comum o “contrato de financiamento de bem imóvel com pacto adjeto de hipoteca”.
O próprio imóvel era dado como garantia por meio de hipoteca.
Só que o trâmite judicial para executar a garantia hipotecária sempre foi muito demorado, o que era péssimo para os bancos.
A nova garantia da alienação fiduciária viabilizou uma execução bem mais rápida, o que foi excelente para os bancos.
Os bancos sempre alegaram que para uma garantia tão vantajosa haveria a contrapartida de juros mais baixos, pois o risco dos empréstimos diminuiria consideravelmente.
E, de fato, em comparação com uma operação sem garantias, acaba-se praticando juros menores.
O que não significa, entretanto, que os juros com essa garantia sejam tão baixos quanto deveriam.
Garantia para empréstimos e financiamentos de pessoas jurídicas

A alienação fiduciária também é bastante usada como forma de garantia para empréstimos concedidos a pessoas jurídicas.
E esta exigência pode se dar em dois momentos distintos:
- No primeiro contrato, quando a empresa procura o banco para tomar um empréstimo ou financiar um bem;
- Quando o empresário, desesperado, volta ao banco para tentar renegociar o primeiro contrato.
O banco sempre tenta otimizar os seus resultados e desde o primeiro momento, ele vai tentar conquistar uma garantia frente ao devedor.
Vai tentar empurrar a alienação fiduciária ou dificultando o empréstimo ou colocando a garantia como uma forma de ter uma operação com condições facilitadas.
É nesse momento que muitos caem, achando que conseguir juros menores, que geram prestações que se encaixam no bolso do empresário, justificam dar o bem em garantia.
É um barato que pode sair caro (muito caro)!
Se o cliente não cede ao banco e não dá bens em garantia, ainda existe uma segunda oportunidade, onde o banco tem maior poder de barganha.
O empresário em dificuldades, às vezes desesperado, tenta renegociar os vários contratos que tem com o banco: empréstimos, financiamento, cartão de crédito, cheque especial.
E aí existe uma segunda pegadinha!
Não caia nessa pegadinha do banco
Com frequência, gerentes sugerem às empresas em dificuldades financeiras e que possuem diferentes contratos e operações bancárias para fazer uma consolidação.
Ou seja, reunir todas as operações em um só contrato, transformando-a em uma operação unificada.
A ideia seria “reorganizar” as dívidas da empresa, facilitando o cumprimento das obrigações.
Daí, um cheque especial atrasado, um financiamento, uma dívida, um cartão de crédito vira tudo uma coisa só.
Aparentemente, fica mais fácil discutir e negociar com o banco quando a dívida é uma só, certo?
Mas esta regularização feita pelo banco é direcionada olhando lá para a frente.
Por um lado, busca-se encobrir todas as diversas irregularidades contratuais, que ficam para trás, nos antigos contratos.
E com a justificativa de conseguir uma taxa de juros “mais baixa” para todas as dívidas, se exige um bem imóvel que será dado em garantia de alienação fiduciária.
Num primeiro olhar, parece um grande negócio: todas as dívida ficam mais baratas, com juros menores, aplicados em bloco a todos os contratos consolidados.
Mas quando sabemos que a alienação fiduciária é o terror das garantias, entendemos que na verdade o banco conseguiu uma super garantia aplicada a todas as dívidas da empresa.
Antes tivesse dado o imóvel em garantia para apenas uma das dívidas.
Mas não! Agora todas as dívidas estão garantidas e o risco de perder o imóvel frente a qualquer imprevisto da empresa é enorme.
Como a garantia é executada pelo banco?

Caso o devedor fique inadimplente, basta que o banco o notifique deste fato.
Conforme exigido na Lei 9.514/1997, a notificação pode ser feita pelo oficial do Registro de Imóveis ou do Registro de Títulos e Documentos (cartório) ou pelo correio, com aviso de recebimento.
Uma vez notificado, o devedor tem 15 dias para pagar as parcelas vencidas, acrescidas de todos os encargos contratuais.
Atenção aqui: não se trata de pagar a última parcela e ficar em dia com o financiamento.
É pagar todas as parcelas vencidas, o valor integral do saldo devedor.
Digamos que a dívida seja de 100.000 reais.
Vamos ignorar a incidência de juros, multas e outras taxas e imaginar que você tenha pago 3 parcelas de 1.000 reais e ficou inadimplente.
Neste caso, o banco, após 15 dias, vai te notificar e exigir que você pague todo o saldo devedor.
No caso, algo em torno de 97.000 reais.
Se você não pagar, o banco passa a ser o proprietário do bem.
Sendo proprietário, ele pode ajuizar uma ação de despejo para retomar a posse direta do bem.
E ainda serão incluídos neste saldo devedor todos os encargos legais, como taxas condominiais atrasadas, impostos, despesas de cobrança e da intimação.
Desesperador, não?
Qual o prazo que o devedor tem para pagar a dívida?
E a lei é claríssima neste ponto: não sendo paga a dívida em 15 dias após a notificação, a propriedade do imóvel se consolida em favor do credor.
Ou seja, do banco!
E como fica a situação do devedor?

Não tem perdão.
Como diz um amigo, banco não tem coração.
Claro, vivemos em um Estado Democrático de Direito e há algumas salvaguardas que precisam ser observadas.
Apesar de todos os favores legais, os bancos cometem muitos erros.
Você precisa estar atento aos detalhes.
Há na lei alguns mecanismos que podem lhe beneficiar.
O gerente do banco não é seu amigo
Talvez você já saiba disso.
Caso ainda não saiba, vou dar-lhe uma notícia.
O gerente do banco não é seu amigo.
Ele é cordial, educado e possivelmente deve ser uma pessoa de bem, que não deseja o seu mal nem a sua ruína.
Não estou defendendo aqui que você tenha que tratar mal o seu gerente, ou que tenha que ser ríspido quando ele quiser saber como vão as coisas.
Enfim, o gerente não é seu inimigo, mas ele não age conforme seus interesses.
Ele age conforme os interesses do verdadeiro vilão dessa história: o banco.
O gerente tem metas e é obrigado a batê-las.
Se ele não faz isso, não pode ser considerado um bom profissional.
E dentro destas metas certamente está incluído fazer você pagar o maior valor possível de juros, encargos, taxas, multas, etc.
Isso é um jogo, não um relacionamento interpessoal.
Mantém-se no jogo quem conhece as regras e tem uma posição de vantagem sobre seu oponente.
Como lidar com o banco num jogo em que ele tem mais vantagem do que você?

Vamos agora às dicas práticas.
Como lidar com o banco que tenta impor que sua empresa dê bens como garantia das suas dívidas.
1. Resistir ao máximo a dar um bem em garantia de uma operação bancária

Entendendo que estamos lidando com o terror das garantias bancárias, tenha em mente que ela será a última alternativa para salvar a sua empresa.
Alienação fiduciária será a última das últimas alternativas, certo?
Existem caminhos para conseguir negociar com o banco sem colocar seus bens em jogo.
Enquanto não há bem dado em garantia, ainda existe um certo equilíbrio de forças com o banco.
Mesmo que existam bens que possam ser penhorados pelo banco, se esses bens não foram dados em garantia num contrato de alienação fiduciária, o banco terá que entrar com a execução judicial.
Nesse caso, a balança estará mais equilibrada e você, devedor, terá não só mais condições de negociação com o banco, como mais chances caso precise se defender numa eventual ação judicial.
2. Entenda a posição do banco no jogo da negociação

Saiba que a posição de vantagem do banco nem sempre é suficiente para impor uma alienação fiduciária.
Se for o caso, mesmo contratando juros um pouco mais caros, ainda é vantagem conseguir um empréstimo sem dar bens em garantias.
Eu gravei um vídeo falando sobre os erros de negociação das empresas com os bancos.
E um dos erros (no vídeo, o erro # 3) é o de dar a própria casa em garantia de empréstimos da sua empresa.
Não sei se você já ouviu falar na expressão “bem de família”.
No Direito, esses bens são considerados impenhoráveis.
Ou seja, o banco não poderia tomar o seu imóvel através de medida judicial.
Mas existem exceções à impenhorabilidade. E uma delas é a alienação fiduciária.
Se alienou um bem de família para o banco, ele pode tomá-lo sem a necessidade de medida judicial.
Basta a notificação em 15 dias, como falamos mais acima.
Está vendo que se trata realmente do terror das garantias?
Confira o vídeo e entenda mais sobre os erros de negociação: 5 maiores erros das empresas ao negociar com bancos.
3. Cuidado com a estratégia da “melhoria de posição”

A cada nova renegociação da dívida, o banco busca melhorar a sua posição com relação ao devedor.
Essa estratégia é chamada entre os profissionais da negociação de “melhoria da posição anterior”.
A ideia é buscar ficar numa posição mais vantajosa do que antes.
Por isso o banco, quando renegocia, tenta empurrar uma garantia adicional, uma venda casada de algum seguro, título de capitalização ou então tenta tirar de você um pagamento à vista mais generoso com a promessa de um desconto.
Em qualquer negociação, o banco age de forma técnica, usando de profissionais com anos de experiência, lidando exclusivamente com esse tipo de operação.
Já o empresário não conhece nada disso.
Ele sempre esteve focado no seu negócio e muito dificilmente conseguirá se contrapor ao banco e impedir que ele se coloque numa posição mais vantajosa.
Esses profissionais são treinados justamente para desequilibrar a balança para o lado do banco.
4. Faça a portabilidade da dívida

Quando o banco se mostra muito intransigente na negociação, ou condiciona a revisão da dívida ao oferecimento de uma garantia, ainda assim o cliente tem opções.
Uma das alternativas pode ser bastante interessante em alguns casos.
Trata-se da portabilidade da dívida para outra instituição financeira.
Você pode fazer um orçamento nos principais bancos, verificando se é possível reduzir o custo do financiamento.
Conseguir reduzir os juros de uns 12% para 10% ao ano, por exemplo, já dá uma redução considerável, fazendo a dívida caber no bolso da empresa novamente.
Nem sempre é fácil conseguir a portabilidade, porque a instituição que está sendo trocada costuma dificultar o processo.
Além disso, é preciso checar todas as novas condições do novo contrato, para não entrar numa fria ainda maior.
O ideal é fazer a avaliação técnica do CET (custo efetivo total) da dívida, para pesar se realmente está sendo vantajosa a portabilidade.
5. Renegocie de forma profissional

Quando o empresário se vê apertado com suas dívidas, ele acaba buscando o banco para renegociar.
Como disse mais acima, esse é um momento que o banco tende a ter maior poder de barganha.
Por isso, vai propor a consolidação dos vários contratos e garantir a dívida, de preferência com um imóvel.
Lembre-se que você não é refém do banco e não precisa aceitar as condições impostas.
Há uma forte cultura no Brasil de que a empresa deve tentar resolver tudo sozinha, mesmo quando a solução envolve conhecimento técnico especializado.
Em parte, há uma certa razão, pois se a empresa for pagar para resolver todo tipo de problema, vai comprometer seu lucro.
Mas existem baratos que saem caros!
A questão da dívida com bancos pode ser uma delas.
Quando tratamos de dívidas de pessoas físicas, que devem 20 ou 30 mil reais para o banco, faz sentido a pessoa tentar resolver o problema por conta própria, indo ao banco negociar.
E olha que ainda existe um risco considerável do cliente piorar sua situação por desconhecer as boas técnicas de negociação com bancos.
Por outro lado, quando lidamos com dívidas empresariais, que às vezes ultrapassam a casa do milhão de reais, daí não há como pensar em renegociação por conta própria.
Qualquer pequena conquista diante do banco pode significar muito, diante do valor da dívida.
O especialista em negociação vai conseguir melhorar a posição de vantagem do devedor, por meio de uma avaliação da real situação da empresa diante do banco.
E por meio da análise dos documentos e dos contratos bancários será possível traçar uma estratégia de negociação mais realista, sem a necessidade de ceder às imposições do banco.
A alienação fiduciária, terror das garantias, não precisa ser a única alternativa da empresa quando se negocia de forma profissional.
Quer saber mais sobre negociação com bancos?
Se quiser saber mais sobre negociação com bancos, separei algumas publicações aqui do site.
Negociação: entenda como o banco pensa
Como negociar com os 5 maiores bancos (que dominam 80% do mercado)?
5 maiores erros cometidos por empresas ao negociar com bancos [Vídeo]